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10 de dez. de 2011

Do que éramos



E aí veio ele certa vez, com essa de querer confessar e confessou, sem usar tom de confissão e nem qualquer outro tipo de tom. Usou o seu próprio tom e acabou por falar: Eu era diferente. Me olhou em seguida tão rapidamente que eu pensei: "Puts, que coisa de apaixonado!" E era mesmo, embora eu não estivesse. Não naquele momento. Eu só queria na verdade ter alguém assim, falando de mim pra mim. Talvez devido a esse meu lado meio leonina que implora por elogios e cede a caricias de quaisquer que sejam essas palavras.
Ele só falava de mim, pra mim, pro mundo e pro resto que estivesse em volta dele, que estava mesmo apaixonado... E o homem quando apaixonado fica leve como uma mulher, se torna quase uma por dentro. A paixão talvez seja mesmo um sentimento feminino. 
Eu tinha medo do escuro e isso só não me deixava mais aflita porque ele quando não se tornava a minha luz, estava por perto para acender uma. 
Aquilo era legal, sabe?! Entre todas as histórias, a minha estava sendo a mais bonita. A melhor já vivida por mim e por ele. Entre a das minhas amigas, a minha era a mais bonita. O problema é que a gente só se dá conta de que era uma história, quando ela acaba e você para pra reler os capítulos. E acabou, não só uma vez, acabou duas... Acabou três. E em todas elas foi ele quem usou do velho e próprio tom para reafirmar e segurando a minha insegurança, me relembrar: Ele só não estava apaixonado por mim, ele era apaixonado por mim!
Após a terceira eu descobri que eu era também. E só não mais do que ele por ser calma e receosa o bastante para entrar de cabeça assim em alguma coisa. Mesmo sabendo que essa "coisa" estava durando mais ou menos nove meses. 
Passamos a nos beijar mais lentamente, sabe? Parece que aquela coisa de querer arrancar tudo um do outro num beijo quente de quem vai e volta já havia passado. Parecíamos dois adultos que se beijam de forma calma, de forma pensada.
Ele passou anos me perguntando sem obter resposta: "Quem é você?" Ele não sabia, nunca dei certeza de nada mesmo. O meu único medo era de que ele descobrisse antes de mim. Na verdade, eu não estava querendo ser misteriosa como forma de conquista, eu realmente não sabia nada sobre a resposta. Talvez se ele soubesse, teria desistido de mim.
Eu era de família italiana, todo mundo falava alto com gesticulações grandes e isso te assustava no começo. Logo era ele quem estava gritando junto a mesa com todos os outros. E só me dava silêncio quando eu, no auge das minhas crises existenciais criava possíveis maneiras de falar que mesmo estando apaixonada, eu queria ficar longe. Eu não queria sabe? Eu só queria sentir um pouco o medo de te perder. Queria sentir como se ele estivesse escapando, só para poder reconquistá-lo por puro e glorioso mérito meu que já havia o conquistado desde outras vidas. 
O meu medo não era só que nosso beijo se transformasse em um beijo de adulto, o meu medo era nós nos tornarmos tão adultos e esse amor tão adulto a ponto de nem nos beijarmos mais.
Talvez nunca tenha sido amor, talvez tenha sido apenas um "Nós dois" evoluído no meio de tantos outros dois que se formam pelas noites. Meu medo talvez fosse você se cansar de não poder me denominar, de tanto não saber quem eu sou, desistir dos almoços de gritaria com a minha família por estar em busca de um silêncio tão quieto ao ponto de me pedir silêncio, puro e suave. E me pediu... E eu não soube negar, embora eu quisesse questionar. Mas tudo bem, talvez seja assim mesmo. Um dia após o outro, um mês após o outro, um ano após o outro: Uma vida após a outra. 
E por ter tanto medo das coisas, devo agora enfrentar o escuro e acender a luz sozinha.

5 comentários:

  1. "E por ter tanto medo das coisas, devo agora enfrentar o escuro e acender a luz sozinha." Não é que é tudo verdade?

    Eu amei, me encontrei e me reencontrei lendo esse texto, algumas partes são tão minhas que nem parecem escritas por você.

    Cada texto seu é um encontro meu, comigo sabe? Bom, você entende, melhor que ninguem..

    Adorei amiga, foi um dos melhores, se não, o melhor!

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  2. Li o "Do que éramos" e "O folhetim de Capitu".
    Párabens, você escreve muito bem, com muita intensidade e sabor.
    Difícil ler um texto assim, com tanto prazer e tão leve.
    Muita naturalidade.

    Até
    Mauro Jorge

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